Poppers, o inalante de raves, house parties e club scene, nunca saiu de cena

“Ele lhe proporcionará uma experiência avassaladora e única.” “A entrega é rápida e segura, em embalagem discreta.”

A rede de computadores está cheia de anúncios como esses. São os famosos poppers: drogas da família dos inalantes muito utilizadas em festas – disco/club scene – dos anos 1970, quando se popularizou, festas raves dos anos 1990 e house parties atualmente.

Vendidos em pequenos frascos de vidro para ser abertos e cheirados periodicamente, os poppers, na verdade , são alkil nitritos – uma série de compostos químicos voláteis, como methyl nitrito, amyl nitrito e ethyl nitrito – e são facilmente sintetizados a partir de álcool, nitrito sódico e solução de ácido sulfúrico. Provocam relaxamento, vasodilatação e sensação de bem-estar. Como levam à dilatação da musculatura lisa, incluindo a anal e a vaginal, são utilizados durante o ato sexual com a promessa de potencializar o prazer. São muito usados por grupos específicos, além de frequentadores das festas, como homossexuais masculinos em sauna gay e festas de conteúdo sexual.

Desde a sua popularização na década de 1970, os poppers sempre estiveram nas paradas de sucesso, com alguns picos de uso – na própria década de 1970 e depois, na era rave, em 1990. Nunca se tratou de uma droga muito alardeada ao público geral, mas sempre esteve presente nesse contexto. É pouco conhecida dos pais, por ser utilizada apenas nesses ambientes “especializados” e por um público em uma fase da vida na qual o prazer, a diversão e a curiosidade estão aflorados: os jovens, inclusive os adolescentes.

Atualmente essa droga vem sendo usada também em house parties. Essas festas aparentemente promovem a ideia de realizar diversões e comemorações na própria casa, e não mais em clubes, mas a proposta inicial foi distorcida por um grupo de pessoas para a promoção do que é proibido aos adolescentes: sexo, bebida e drogas. Essas house parties proibidas, promovidas por adolescentes na casa dos pais e, obviamente, na ausência deles, são frequentadas também por adultos, que aliciam o jovem para que ele minta aos pais, dizendo que participará de festa na casa de um amigo conhecido – portanto, sem levantar suspeita. Como há bastante conteúdo sexual, os poppers são bem-vindos nessas festas, além, é claro, da bebida.

Assim como todos os outros inalantes, os poppers são bastante deletérios ao sistema nervoso central no longo prazo, e seu uso continuado pode levar à morte neuronal com dano cerebral e deficiência cognitiva. Neste ano, há relato de um caso, na literatura médica, de retinopatia por poppers (lesão grave em tecido ocular por dano vascular), mas parece ser algo raro.

Durante a intoxicação, o que prevalece é a sensação de bem-estar, mas ocorre relaxamento muscular, incoordenação motora e prejuízo da crítica. Existem muitas pesquisas associando o uso da droga à transmissão de HIV, a última delas entre chineses, mas existem estudos anteriores na população europeia. Essa relação parece ser estatística, por causa do comportamento de risco, ou seja, quem usa poppers também tem comportamento de risco para doença sexualmente transmissível. Esse comportamento parece estar potencializado nos usuários, porque há, durante a intoxicação aguda, diminuição da crítica e forte associação do uso com o sexo; logo, o jovem acaba se expondo ao sexo sem proteção. Em associação ao consumo de medicamentos para manutenção da ereção (como Viagra e similares), pode provocar queda brusca na pressão arterial e há risco de morte. Na bula desses medicamentos há uma recomendação específica sobre a interação com nitritos, mas raramente o jovem sabe que os poppers são um nitrito. No período pós-uso, o usuário pode apresentar dor de cabeça, náusea e vômito.

Os poppers não são uma droga de rua e seu uso se restringe a essas populações específicas – portanto, não é tão divulgado e a informação sobre os seus riscos é baixa entre os jovens. O que preocupa, além disso, é que essa droga continua atuando nos bastidores do mundo juvenil (internet, baladas e festas, com grande apelo sexual). Sem criar tanto alarme, ela está em cena há 46 anos, resultando em usuários e prejuízos.

Luis J1, Virdi M1, Nabili S1. Poppers retinopathy. BMJ Case Rep. 2016 Mar 7; 2016.

Zhang H1, Teng T1, Lu H2, Zhao Y2, Liu H3, Yin L4, Sun Z1, He X5, Qian HZ4, Ruan Y1, Shao Y1, Vermund SH4. Poppers use and risky sexual behaviors among men who have sex with men in Beijing, China. Drug Alcohol Depend. 2016 Mar 1; 160:42-8.

Fonte: SPDM – Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina